terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
Alma gêmea, sei!
Desenho de Marcelo Bittencourt.
Toronto.
2011, Feb.
Minha adorável amiga brazuca me contou, por e-mail, que foi a um centro espírita, com duas amigas descoladíssimas nesses assuntos.
Ela ficou sabendo que reencarnação é coisa muito séria e sem garantia alguma de melhora. O espírito de Hitler, por exemplo, numa outra vida, não foi nada cool e quando reencarnou e teve a sua segunda chance... foi Hitler! A nobilíssima Joana d' Arc, em vidas anteriores, foi ninguém menos que Judas Iscariotes. Mas o que mais a impressionou foi saber que alguns poderosos foram em outras vidas também poderosos, poderosíssimos. Napoleão foi César e assim perpetuou o aforismo: “a César o que é de César.”
Empolgadíssima com as historietas de quem foi quem, ela pensou: aposto que eu fui uma daquelas ninfas da mitologia grega; aqueles seres encantadores que alegravam os deuses, curavam os doentes, abençoavam os amantes. Pensou delirante: posso até me ver entoando cantos, gentilmente, aos amantes. E ela, efusiva, imaginando-se na sua missão, concluiu: puxa vida, tenho que reconhecer, não fui boa, mas perfeita! Como eu soube inspirar amor e sacanagem - combinação nem sempre possível.
"- Será que eu fui Cleópatra"? Sussurou, em seu ouvido, sua amiga.
“- Claro que sim. NÓS fomos Cleópatra! E para o nosso consolo, a Demi Moore não deve ter sido - seria marmelada demais pro meu gosto.” - respondeu minha amiga.
Indagaram: “Alguém pode ser bonzinho numa vida e ser mau, muito mau, em outra vida?” “Pode uma pessoa alcançar um grau elevado de conhecimento e vir, em outra vida, um ser mediano, talvez até burrinho?” A palestrante disfarçou a saia justíssima e, com firmeza, respondeu: “Sim, é possível, por causa do livre arbítrio.” - contou-me minha amiga, com certa gravidade.
A cabecinha inventiva de minha amiga disparou: Ah, de uma coisa eu tenho certeza, rã eu não posso ter sido nem aquelas coisinhas branquelas que vivem grudadas no teto, olhando pra gente de cima, debochadas, como se... ih, será que lagartixa, um dia ops!, numa outra vida, foi um ser dotado de razão e conhecimento? Será que por isso elas ficam do alto zombando da gente? Quando não despencam sobre a nossa cabeça; sentença do Além? - pensou.
Com sua farta imaginação, minha amiga torceu para que as histórias chegassem às alcovas imperiais de Roma. “Revelações de fontes não-oficiais poderiam ser feitas sobre quem comeu quem, ou quem ficou louco para comer alguém, mas morreu na vontade... imagina?” Disse-lhe que não acreditei que ela ficou pensando nisso, mas não cheguei a censurá-la, pois fomos feitos de carne e osso porque um homem e uma mulher fizeram sexo – e não ficaram só na vontade. Confesso, no entanto, que fiquei curiosa pra desvendar se a rainha do Egito, a bela forasteira que arrebatou o coração do disputado cidadão romano, Marco Antônio, teria sucumbido mesmo à mordida de uma cobra... Mas, pensando bem, os mitos merecem o casulo silencioso dos grandes mistérios.
Contou-me que muitas pessoas faziam perguntas e que lá havia mais ou menos umas 80 pessoas, "se bobear, umas 100!" – crianças, jovens, adultos, idosos, gente que vai lá há mais de uma década; pessoas que saem do trabalho, moram longe, cruzam a cidade pra lá chegar; vão de ônibus, metrô, carona, à pé, mas não deixam de ir. Casados, solteiros, viúvos, divorciados, pessoas querendo tomar outro rumo, ou que ainda não o encontraram...
Algumas leituras sobre traumas e amarras de vidas passadas, e muitos nós foram explicados pela dinâmica da causa e efeito “que vale mesmo pra hoje, pra esta vida, right now! sobretudo para o amor que podemos dar e receber, senão haja vida pra saldar tantos desatinos”, advertiu-me minha amiga.
Às 21h, o momento do Pai Nosso. As pessoas se uniram pra rezar, calaram-se e pediram conforto e amparo para os doentes terminais, pra quem sente frio nas ruas, para os famintos – já que a fome tem muitos nomes - para as pessoas desassossegadas por doenças, aflições, perdas e, ela me disse entusiasmada que, naquele momento, todos se uniram numa corrente de fé e esperança, como se os mundos imaginados por cada uma daquelas pessoas fossem apenas um.
Minha amiga me perguntou, com muito jeito, se eu acreditava em alma gêmea. Respondi: Of course not!
Prosseguiu: “Pois é. Esse negócio de alma gêmea é uma roubada. Nonsense. Não quero ser dona da verdade nem deselegante e nem passa por minha cabeça desmantelar o seu dominó de verdades, com outra desvelada pela palestrante - caso você acredite em alma gêmea ou esteja procurando a sua... Melhor mesmo esquecer esse papo de alma gêmea, pelo menos, nos são abertas outras possibilidades pra vivermos um grande, ou médio, ou pequeno amor, sei lá, um amor simples, quem sabe...
Anyway, o que sei é que essa amizade eu preservo com gosto. Seria pouco razoável deixar passar a reencarnação de um espírito amável como esse. Ainda bem que me especializei em literatura brasileira - será que isso significa alguma coisa? Oh my!
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Rose F. Jones
Postado em Balaio da Vivi.
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