terça-feira, 15 de junho de 2010

Sábado comprometido


Foto: Geraldo Magela.

Solteiras reclamaram que neste ano o Dia dos Namorados caiu bem no sábado. Não podia ser pior: estar sem namorado e não conseguir sequer uma mesa em um restaurante pra poder rir da solteirice aguda com as amigas. Pra rir das tentativas dos últimos romances... Da insistência em arrancar água de pedra em alguns casos - ah, sim! Rir de si mesma, com as amigas. Rir dos fracassos amorosos que, já se sabe, se repetem algumas vezes. Melhor data não há pra se encontrar com as amigas e rir - com champanhe, sem champanhe, vinho ou cerveja ou uma pinguinha, por que não? Afinal, não é sempre que se consegue reunir amigas dispostas a rir de si mesmas.

Casais queixaram-se: “Pra complicar, as filas estão enormes nos shoppings!” O namorado novo e indeciso pra escolher o presente, ainda sem saber como impressionar a nova namorada, pediu ajuda a uma amável vendedora - que roubada! O marido temendo dar à mulher o mesmo presente do ano passado - a essa altura só a secretária pra saber – irritado ficou com a impossibilidade de não localizar sua secretária a tempo, pois, se não conseguisse falar com ela, estaria ferrado! O pai acostumado a pedir às filhas pra comprar o presente da mãe - sua eterna namorada – esforçando-se pra escrever um cartão - claro, com a ajuda das filhas - ligou pro celular de uma que estava no trânsito, a caminho da festa junina do filho na escola:

"- Ah, papai, agora eu não tenho cabeça, tenho só ombro, pescoço e orelha pra segurar o celular e tou sem ideia. Acho que o João Victor, papai, não tá caipira, pelo menos não o suficiente, e vai rolar um concurso de garoto mais jeca! Fui ouvir a mamãe... Acho que ele tá muito arrumadinho e lindo como todos os dias. Como pode eu não conseguir deixar o meu filho jeca, papai? Não sei, não sei, liga pra Ju - ela é ótima em bilhetinhos de amor. Tenho que desligar, papai. Beijo."

E todo esse corre-corre justamente no sábado!

Ficantes vibraram que o Dia dos Namorados caiu exatamente no sábado. Diante do espelho, a garota se arrumava e pensava: - Quem arquitetou isso, só pode ter pensado em mim! À festinha na casa da Bia ele vai e lá quem sabe rola um namoro? Quem sabe... Da fase pegando já passamos, embora... Suspirou a garota diante do espelho.

E mais um dia em homenagem aos namorados - para solteiros, ficantes, namorados e casados. Uma data curiosa que incomoda. Estar sem ninguém no Dia dos Namorados para alguns tem o peso de uma sentença: o vazio prolatado de uma vida dedicada a não ter ninguém – como se fosse capricho. Para quem está em uma relação em que os corpos não se entendem mais, o Dia dos Namorados soa desagradável, constrangedor. Um homem e uma mulher cujos corpos se estranham são torturados a comemorar o que não há mais entre eles pra ser comemorado. E aqueles ávidos para emplacar o relacionamento e ansiosos para se tornarem namorados não conseguem experimentar as gostosuras do enamoramento. Esquecem-se de que é preciso tempo pra se preparar para o namoro, sobretudo depois de algumas desilusões.

Precisa-se de tempo para o namoro. Tempo pra despertar as fantasias com a voz, o olhar, o semblante, o silêncio do outro. Tempo pra reconhecer o corpo, as mãos do outro, inesperadamente, no meio de outros corpos e mãos em uma feira, um show, uma praça, uma festa, na praia, no parque, entre todos os outros corpos e mãos desconhecidos. Ali, no meio de todos os outros, reconhecemos o corpo e as mãos de quem já estamos “namorando”. Para isso é preciso tempo. Coisa que namorados de verdade sabem e não querem perder.

Para quem não dispensa o tempo pra estar junto com o outro pra simplesmente namorar, o Dia dos Namorados é só mais um dia. Um outro dia para o namoro. Um dia pra namorar sem vergonha dos clichês - até quando “enfim, sós!”... Não importa.

Viviane Campos Moreira.
Crônica postada em videbloguinho

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