terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

O GOSTO DO AMOR


 
Amor, filme de Michael Haneke, conta a história de um homem e de uma mulher, companheiros e amantes, que envelhecem juntos.

Georges (Jean-Louis Trintignant) e Anne (Emmanuelle Riva) são octogenários, independentes, realizados e vivem em Paris, em um apartamento habitado por música, livros, discos, quadros, boas lembranças, bom papo e desejo.

O  homem apaixonado não deixa de dizer à mulher o quanto ela está linda. A mulher apaixonada não deixa de escutar o elogio.  O amor de Georges por Anne e de Anne por Georges está presente nos cuidados de um com o outro em um cotidiano que se transforma radicalmente.

Eles tornaram o amor uma presença suave no café da manhã, nas tarefas da casa e na conversa. Um amor com o gosto do prazer de amar. Eles amam o amor que inventaram e vivem esse amor, com certa exclusividade. 

Anne adoece e Georges está junto. A dor de Anne é também a dor de Georges. Anne sabe disso e gostaria de poupá-lo. Ela sabe que a bela vida em comum vai perder o que conseguiram construir. Cúmplices,  passam a viver esse momento de fragilidade diante de uma doença sem cura nem melhora.

Eva (Isabelle Huppert), a filha única, se relaciona com os pais com distanciamento. O amor dos pais, um amor de homem e de mulher, um amor vivido com o corpo, um amor que soube se reinventar várias vezes ao longo da vida, parece não ter inspirado Eva.

Em uma cena, Georges demite uma cuidadora que maltrata Anne. Não basta que deem banho, penteiem o cabelo, escovem os dentes e deixem sua Anne pronta, cheirosa e bonitinha no quarto, ou na sala de estar. Georges não é um homem que brinca com a dignidade. O que isso diz? E a quem diz?

Talvez nos diga, a cada um de nós, que os velhos precisam de mais proteção dos seus. A Justiça vem sendo buscada para responsabilizar quem não se julga responsável, ou para dar solução a conflitos que poderiam ser resolvidos sem a interferência do Estado, ou para dar uma resposta a algo que o sujeito não dá conta na sua relação com os pais.
 
A última cena silenciosa traz o vazio no apartamento com Eva no lugar de herdeira. O que a filha, como mulher, vai escolher herdar da sua mãe?

Todos teremos que enfrentar o fim. Talvez a finitude nos torne cúmplices de Georges e Anne. A vida deles foi bela, pelo menos.


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Viviane C. Moreira

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